domingo, 8 de outubro de 2017

Porque é que fotografas o que é velho?


Fotografo o que está vivo na minha memória; fotografo com sentido. Sei de onde venho e o que me fez. Sei quem sou e recordo-me numa vida que me faz feliz. Relembro os passos, os sorrisos e os afetos. Abraço o que faz parte de mim.

Uma simples tenaz transporta-me ao outono. Enquanto se apanham as estevas que engrossarão o manturo, surrupiam-se meia dúzia de doces bolotas. As noites que se lhe seguem são de jogatina de cartas ou dóminó ; enquanto, entre o cheiro e a cinza da esteva e do sobro, se assam este frutos cujo aroma e sabor superam a castanha (inexistente por terras do Alentejo). 


No quentinho da fogueira, é a tenaz que vira e revira impregnando a memória de paladares inesquecíveis. Lembro-me da braseira e da mesa com buraco, da toalha em forma de saia. 



Se no outono caiem as primeiras chuvas: sinto o cheiro da terra molhada; lembro a corrida para esvaziar o estendal;  a apressada caminhada entre a casa do fogo e a casa principal; o velho pote de cal que todas as manhãs pintará a cozinha; as pedras para esmagar as azeitonas e os velhos potes onde se adoçam… 


Recordo os orégãos e a corrida, entre gotas de chuva, para apanhar o hortelã (tarefa dos miúdos; num tempo em que os abafos ou casacos se substituíam por fugidas). 


A memória prova-me, a cada instante, que sou alentejana e mantém em mim o afago que me une ao meu pai e aos meus avós.
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Sorrisos

Guida Brito

sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Santa Margarida da Serra


      Uma hora sem compromissos ditaram um deambular por Santa Margarida da Serra- uma pequena localidade no Concelho de Grândola. Perfeitamente enquadrada na paisagem, mantém o traçado do antigo Alentejo. As cores, os montes, as ruas limpas e caiadas, a paz, a calma, o cumprimento dos habitantes... um Alentejo puro e doce.
Viagens com sentido

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Ficam os hotéis se pretender pernoitar

Sorrisos
Guida Brito

Imperfeição perfeita

    O que nasce tordo: tarde ou nunca se endireita- diz o povo. E ainda bem- digo eu. O diálogo nasce da discórdia e das diferenças. Que graça teria o mundo se fossemos chapa 4 de um molde que mesmo velho e ferrugento não deformasse ? Igualdades só nos direitos e adaptados à diferença.
   Para os mais cépticos: coloco o  horizonte onde eu quiser. 
   Oh! Santa Barbatana!
Sorrisos
Guida Brito

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Um mundo só meu

                                                                         in Amesterdão
     Um mundo de paz, calma e nuvens. Adoro esta foto pela tranquilidade que a envolve. Era de madrugada e apenas os pedais se faziam ouvir: uma manhã com sentido. Viajar é isto: beber as horas impróprias dos locais desgastados pela azáfama do excesso de gentes e sons.
     Quero perder-me no silêncio dos locais incomuns.
Sorrisos
Guida Brito

O pequeno almoço



     Adoro viajar; principalmente para sítios onde os sons audíveis não se simplificam e não se traduzem no interior da minha caixa craniana. Um misto de gestos, francês, inglês, alentejano e o talvez exista são suficientes para obter o que não quero. Distar da normalidade de procedimentos ainda é o melhor anti-stress que conheço. Antes do café da manhã, não se faz o que quer que seja- uma aprendizagem que embora consolidada decidi contrariar. Pois...


     Atraída pelo pão de sementes da mesa ao lado, lá estiquei o dedinho- indicando a igualdade de quereres ao dos ocupantes da mesa vizinha. Fotografo a beleza do pedido enlevada pelas cores e  ocupação do espaço. Estranhei a chegada, imediata, dos pombos mas nada me fazia prever o que se seguia à primeira dentada (a falta que um café faz).

     Bebo o primeiro gole do néctar matinal, o olhar sorri e, de forma voraz, arrisco a primeira trincadela. Ai! Minha Santa Barbatana. O visualizado não teve tempo de ser interpretado por um cérebro adaptado ao não os percebo. Aquele sabor a palha indicou que tinha feito mer... ao pedir o não sei. Nem mais, soltaram-se as gargalhadas: larvas, melgas e mosquitos; bichos e bicharoco (esquecendo o grande e gordo gafanhoto): faziam parte do petisco.


     Não adianta reclamar: comê-los é moda e todos pedem aquela mistela em forma do é melhor não comer.


     Meus amigos, quando a fome aperta tudo nos sabe bem. A pior porcaria parece sempre uma ótima iguaria.
      São servidos?


Sorrisos
Guida Brito

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

In Amesterdão

      
     Recantos de uma cidade que não dorme e madruga adormecida. Um reflexo abaixo do nível do mar. Cidade de gentes que pedalam no infinito de um horizonte esquecido. 
Sorrisos
Guida Brito

terça-feira, 3 de outubro de 2017

É hoje: estou na Rádio Renascença

Eu sei que a hora é muito tardia; os pirralhitos estão na cama mas os progenitores podem ouvir: hoje, entre a meia noite e a uma da manhã, na Rádio Renascença.
Recebi um convite para falar sobre autoestima. À primeira vista, como quem diz, ao ouvi-lo pela primeira vez, parece um enorme palavrão. E talvez seja: é uma palavra tão grande; parece que o mundo cabe lá dentro. Como é que eu vos explico isto? Ai, ai! Estou meio atrapalhada (vocês já me conhecem). Vamos lá! Eu vou fazer uma tentativa.
Falar sobre a Vossa autoestima é falar sobre o dia em que conseguiram utilizar os dons que têm escondidos dentro de vós. É aceitar que todos erramos até encontrarmos o saber. É acreditar; é gostar de quem somos. É não desistir: é saber que dentro de nós existe tudo o que precisamos para conseguirmos o que nos faz sorrir. É imaginar sabendo que um dia o sonho é a realidade do nosso caminho. 
Também é desvalorizar o que não nos pertence; despir o que não é nosso; separar o lixo  do luxo: é atitude.
Autoestima é o vosso sorriso feliz quando a minha cara sorridente, em tom de brincadeira, diz: "Shiiii! Que coisinha horrível!"  Vocês pulam de contentes e sabem que chegaram lá: ao momento em que retiraram, de dentro, as porções certas, na quantidade adequada, e obtiveram a sabedoria. É a coragem usar o que é nosso.
Autoestima é o momento em que somos tão bonitos que já nem nos lembramos o quão difícil foi ultrapassar as barreiras do caminho. Autoestima é o “ser capaz  de fazer” fazer parte de nós. É uma conquista: uma batalha  de sentimentos vencida.  Autoestima é a alegria do saber.

(Por isso eu sou tão chata: eu sei que consigo fazer-vos sorrir. Retiro as minhas poções mágicas e uso-as de forma a que as vossas brilhem sem medos nem vergonhas).

terça-feira, 26 de setembro de 2017

As chitas , o riscado, o cretone, o vestido da vizinha e as camisas da minha avó: “talego”


Com pequenas flores ou cornucópias, em tons de azul e branco, comprava a minha avó restos de tecido. Uma vez no ano, antes da feira de Castro, fazia duas camisas. De saias: uma lhe bastava- um azul ou cinza, escuros, eram as suas cores prediletas. Não sei se a escolha de cores não dependia da imposição da moral da aldeia- já que todas as vizinhas me pareciam iguais de vestimenta. Camisas e calças janotas eram meticulosamente elaboradas e assim vestia o meu avô, em dia de vender as mulas e as vacas. À feira não se ia que não fosse de roupa nova (dia de ajuntamento da região e do abraço aos primos e compadres- que há muito não se viam). Já a vizinha, moça nova, lhe pedia um vestido (em tom de favor) com o tecido de grandes flores que lhe ofereceram e veio do estrangeiro. É que os rapazes iam todos gaiteiros e precisava ir toda jeitosa. Na azáfama que antecedia a feira, caiava-se a casa; com chitas e cretones substituíam-se as saias das arcas e o bancal da cozinha. Se fosse caso disso, ainda se comprava o resto da peça de riscado (mais barato porque tinha defeitos);  substituíam-se os velhos colchões de lã e afofava-se o de palha.


Não! Shiiiiii! Santa Barbatana! Vocês não sabem o enlevo de dormir nos colchões afofados e nos lençóis lavados na ribeira. Ainda sei o cheiro e a doçura de uma noite bem dormida.
De tudo isto, sobravam pequenos bocados de tecido: pacientemente, com as suas mãos enrugadas,  cortava, ao serão, pequenos quadrados de tecido. Com a ajuda das crianças torciam-se linhas de fazer as meias. Lembro com saudade a seca do “não te mexas”; ali ficava eu, de dedo esticado, completamente imóvel: não fosse estragar o dito cordão. Alinhavados e cosidos, os restos de tecido deixavam antever os “talegos”. Os grandes para o pão; os pequenos para o dinheiro.
Hoje, são meus os velhos “talegos”: alembradura dos bons e deliciosos momentos.
      Sinto a falta da minha avó: dos cinco tostões, do beijo, dos recados, da voz que imitava o rude. Sinto falta de quem me sabia tão bem; saudades da dura côdea na gaveta da mesa da cozinha; e, das sobras do quem nada tem e a ainda sobra para a menina.

Sorrisos
Guida Brito

domingo, 24 de setembro de 2017

Paragens no tempo

     As paragens alentejanas: no meio de nenhures servem os que dali distam alguns quilómetros a pé. Perfeitamente enquadradas na paisagem, apresentam-se como monumentos nacionais: são cultura e fazem-nos parar no tempo - num tempo que a carreira já lá vem. Daqui se parte até à vila e se fazem as compras mensais: num consumismo fiel às necessidades básicas (esquecendo o chocolate, os amendoins, os tremoços; a revista dos vips ou ou o que luziu a um olhar que não excede o fundo dos bolsos).
     Esta encontrei-a no Viseus; concelho de Castro Verde: as cores parecem morar ali e o tempo perde-se na brandura do Alentejo.

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Sorrisos
Guida Brito

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Eu quero...

     Eu quero um mapa das nuvens e um barco bem vagaroso.
Mário Quintana

Sorrisos
Guida Brito