O impensável aconteceu: dia não superado. Eu conto tudo.
Aos poucos, vão-se esgotando os restos da despensa. Embora escassos, têm permitido o sucesso da meta a que me propus. O arroz, a massa e principalmente o leite, têm sido ingredientes chave. O maior problema vai ser comprar azeite: gordura que não dispenso- é a mais saudável. O que existe em casa deve temperar mais duas ou três saladas. Vamos ter que nos organizar e pensar numa solução. Errar nas contas ou comprar azeite não constitui um problema grave para mim. Podia, facilmente, excluí-lo e isto parecia o que não é. Não quero: quero saber o que é viver assim; quero acabar com o consumismo impensado; quero acabar com os desperdícios; quero fazer valer cada centavo do meu vencimento (descobri que trabalhei muito para conseguir as sobras que foram parar ao lixo); quero preparar o meu filho para um futuro que não sei e torná-lo o mais autónomo e batalhador possível. Sei que existem muitas famílias que vivem com muito menos do que eu- e sem a segurança do posso acabar com isto; gente que vive ao nosso lado e a quem exigimos posturas que só são possíveis a quem não se desvia de determinada forma existencial. O meu filho "leva da brincadeira", entre aspas, uma aprendizagem que só se consolida na experiência. Aprendeu a gerir de forma controlada escassos meios; aprendeu a desenrascar-se; aprendeu que o muito se esgota e o pouco dá para muito; aprendeu a fazer... aprendeu tanto. Adorei o dia em que tinha deixado apenas pão para o lanche; não havia manteiga; não havia queijo; não havia doce; não havia o que normalmente há no mero gesto de abrir o frigorífico. O meu filho não exigiu, não pediu: havia nectarinas, fez doce. Podia dar-vos n exemplos do sucesso desta "brincadeira", entre aspas. Meus amigos, os nossos filhos estão habituados que a água escorre dos dedos da mãe quando a gritam da cadeira do computador ou do lugar, sentado, do sofá. Habituaram-se ao prato na mesa e ao abrir do frigorífico. E, nós entramos na rotina do é mais fácil. Num mundo correrio: facilita satisfazer, cansa contrariar. São hábitos tão "rotinos" que se tornaram inatos e deixaram de ser pensantes. Em 12 dias, o meu filho tornou-se muito mais homem e isso valida: todos os tostões que não gastei e, toda, a trabalheira desta aventura. Não facilitar é o melhor professor que qualquer jovem pode ter.
Adiante.
Já sabem: pequenos almoços e lanches baseiam-se no leite, cereais, pão e bolachas (que tenho cozinhado); os almoços provêm das quantidades calculadas, em excesso, do jantar.
A hora das compras é a que transborda sorrisos. Hoje, visitei dois supermercados. Primeiro comprei asa de peru- esqueci-me da foto mas consta nas contas. Corri às nectarinas e à couve branca. Sobrava o suficiente (pensava eu) e decidi comprar grãos. Feliz, elaborei um requintado jantar que vai dar para três refeições- já tenho frigorífico; não há problema.
Cozido de couve e grão. O sumo nunca falta.
(Vou deixar de escrever, aqui, as receitas: irei colocá-las na etiqueta "Receitas da minha cozinha")
Após o jantar, fui organizar escritos e talões de gastos; ouvi o resmungar do velho mealheiro e fiquei vermelha como um pimentão: gastara um cêntimo em excesso! Shiiiiii... Santa Barbatana! Atirei-lhe com a caneta e, até hoje, ninguém mais o ouviu: quando não há é para todos.
Sorrisos
Guida Brito