domingo, 29 de outubro de 2017

Seca no Alentejo- na barragem de campilhas, são os jipes e os passeantes domingueiros que ocupam um leito árido e seco.



Hoje, é o silêncio que se impõe perante a desolação por terras do Alentejo. A falta de chuva ecoa onde o nada se faz ouvir. As terras áridas choram, sem lágrimas, à mãe Natureza, uma rega que avive o que já não havia memória. 



As fotografias foram captadas na zona da barragem de Campilhas, Santiago do Cacém: são os jipes e os passeantes domingueiros que ocupam o leito; da barragem, temos uma pequena “poça” . Um cenário que se impõe por todo o Alentejo.


               
As imagens falam por si: deixo-vos no silêncio do cheiro da terra molhada.


















Sem sorrisos
Guida Brito


sábado, 28 de outubro de 2017

Sines - palavras de Al Berto


"... tenho uma varanda ampla cheia de malvas

e o marulhar das noites povoadas de peixes voadores..."
Al Berto

O mar, a luz, as gaivotas e as cores- cidade impregnada de azul (harmonia, tranquilidade, serenidade).
Sorrisos
Guida Brito

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Borda d’Água 1945- “ Reportorio util a toda a gente”


“-Maria, quando calha a lua nova?
- P’éra aí q´ê vô bscar o Borda d’Água.”

Meticulosamente guardado numa das arcas da casa (aquela que guardava os lençóis das visitas, a roupa nova para o dia de feira ; a camisa preta para o funeral do vizinho; o fio de ouro de três voltas e o talego do dinheiro), o Borda d’Água continha tão preciosas informações, indispensáveis à sobrevivência, que era certo e sabido que o seu vendedor, no dia da feira de Castro, rapidamente os esgotava. 


Este almanaque, criado em 1928, aliava a  sabedoria popular, a ciência e a astrologia; talvez por isso os seus prognósticos fossem tão certeiros e tão imprescindíveis na vida do agricultor; na vida das moças novas e casamenteiras (ali consultavam, no seu  Oráculo, as características dos homens nascidos no mesmo mês que o jovem pimpão que as cortejava - bom marido ou aldrabão?); no saber antecipado se era a chuva ou o sol que visitava o monte em dia de colheita ou festividade.


Lembro-me dos bailes de mastro, quando as ruas eram enfeitadas de balões, fitas e bandeirinhas de papel: a sua colocação, nas ruas, era orientada, de forma certeira, por este folheto preciso e com poderes quase divinos em matéria de adivinhação. Não lhe chamarei feiticeiro mas “o grande chefe da aldeia” pela forma como era cumprido e seguido. 


Apresentava-se como bom lembrete da visibilidade planetária, das feiras, festividades e romarias; revelava-se indispensável, cá p’rás bandos do Alentejo - no que se referia a plantios, mondas, sementeiras e “enxertos” das plantas de grande porte. 


Calendário Israelita, marés… uma enciclopédia informática apesar da sua diminuta dimensão: o computador da era antiga- com mais bits e “quilokapas” que o que manuseamos e comprámos na promoção da esquina. Enfim: “Reportorio util a toda a gente” ; como referia a sua capa.


Descobri nos meus caixotes do tudo guardo: o Borda d’Água de 1945. Fascinante! Partilho convosco o Juízo do Ano, realçando as partes que desejo que não se concretizem em 2017- já que por Terras do Mui Nobre Portugal os tons cinza enlutaram as suas gentes e ditaram a total devastidão de onde deveria vir o pão.

“… trigo ve-lo-ão por um óculo, o milho, a fava e tudo mais que se come atinge o valor das pedras preciosas por isso hão-de aparecer colares de grão, anéis de lentilhas, broches de ervilhas e assim por diante…”


Sorrisos
Guida Brito

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Guerreiro- Concelho de Castro Verde (A paisagem parece esquecer o colorido que ali vamos encontrar)


Embora distante de Castro Verde, é fácil lá chegar e a viagem  garante a plena satisfação do viajante: uma aventura no puro Alentejo. Saia de Castro Verde em direção a Mértola; vire à direita seguindo a indicação de Santa Bárbara de Padrões; passe pelo Rolão e siga à esquerda nos Viseus. 


Se, no verão e no outono, a planície se veste de tons dourados; no inverno, renasce a esperança na imensidão de um verde único que cobre a paisagem e florirá, na primavera, o salpicado do colorido que deslumbra o simples ato de contemplar.


Na minha viagem, foi o branco que quebrou as linhas do infinito cobertas a folha de ouro. Não há foto que faça jus ao brilho do nosso olhar. 

A cal, as cores oca, o lavadouro comunitário (ainda utilizado) aguardam-nos na visita ao povoado. 


A limpeza, a calma e a simplicidade acompanham-nos o andar.


Um Alentejo por desbravar.











Sorrisos
Guida Brito

Fortes cheiros a gás, em Sines- formulários para registo de poluição industrial.

     Após os fortes e nauseabundos cheiros a gás que se fizeram sentir esta madrugada, em Sines, decidi procurar onde me queixar e manifestar a minha indignação. Não foi uma ocorrência única, um acidente imprevisível, é uma constante sempre que o vento decide deixar de desalinhar os caracóis. Sabe-me bem manter uma aparência alinhada (que satisfaça os padrões da sociedade) mas o meu organismo e o meu nariz rejeitam, sistematicamente, estas ocorrências  e preferem que os padrões da sociedade sejam satisfeitos no que se refere ao ar respirável. 
    Claramente, uma, ou mais (não sei). empresas da região desrespeitam as convenções internacionais que Portugal assinou e se comprometeu a cumprir. Sou portuguesa e cabe-me informar o governo do meu país sempre que algo desrespeite e quebre, de forma muito grave, o que jurámos cumprir. É o caso, a indústria presente gera milhões de lucros e é responsável pela empregabilidade da região mas tem que o fazer com: respeito pela saúde dos seus cidadãos; respeito pela Mãe Natureza e respeitando os acordos internacionais que Portugal assinou. E isso é possível, existem formas de coexistir com respeito pelo que que é sagrado. É isso que se pede: lucrem e façam-nos lucrar, respeitando e cumprindo. Descobri que a Câmara Municipal se preocupa com o bem estar da população e pede ajuda para identificar situações de poluição industrial; de forma a poder comunicá-las ao Ministério do Ambiente. Façamos a nossa parte ao preencher todos os formulários que o Município disponibiliza: 


Sorrisos (meio atrapalhados devido aos nauseabundos cheiros a gás)
Guida Brito

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Campaniça Trio-Pedro Mestre, David Pereira e Zé Diogo Bento- um grupo com sentido nas memórias do povo alentejano- Feira de Castro 2017


“Apresentam-se como trio”- li algures. E, por muito que pesquise, nada mais se encontra de um grupo que, sendo mesmo três, são únicos na beleza recuperada de um Alentejo quase esquecido. Eles não cantam: encantam. Há muito que ansiava confirmar, ao vivo, a brisa ligeira das vozes que correm e enaltecem o som, tocado e cantado, das gentes da minha terra. É impossível não amar: num afeto sorridente (brincalhão e atrevido) escrevem as memórias dos mais velhos no presente de uma juventude que as orgulha e gosta; aferindo-lhe o   anseio do saber e muito mais. 


Pela mão do seu mentor (Pedro Mestre) recuperam tudo o que distingue, ao longo dos tempos, o Ser alentejano do Ser de qualquer outro lugar do mundo. Da viola campaniça, ao despique, ao baldão, aos bailes de roda, às modas,  aos ditos, ao cante… à recuperação de um rico património oral de outrora; não há nada que lhes escape e resgatam o que é isto do Ser alentejano. Ao som de uma sonoridade única (instrumental e vocal) vão gracejando palavras tão nossas que o público os abraça num Alentejo sentido. É com pureza que “lamentam que as formigas de asas não tenham ido à feira de Castro”  e fazem suas: as expressões dos tempos que já lá vão. Transportam ao presente a capacidade de sorrir daqueles que, numa vida tão dura e áspera, venceram pelo desbravar de caminhos que nos permitem o Ser de hoje.


De um repertório imenso, a minha preferência vai para “Adeus ò Feira de Castro”; talvez porque explica as histórias cantadas “as unhas de pau gasto e as bordas do sim senhor ardendo”. Ai! Shiiii! Santa Barbatana! É obrigatório ouvir e partilhar; ora oiçam:

Adeus ó feira de Castro
Adeus ó Feira de Castro
Que já te fico conhecendo
Levo as unhas de pau gasto
E as bordas do cu ardendo
Foi uma cantiga cantada
Pelo coxo de Alfundão
Uma noite num serão
Às quatro da madrugada
Na caixa não tinha nada
E o tempo corria áspero
Com muitas nuvens no astro
Sem ter casa nem guarida
Faço a minha despedida
Adeus ò Feira de Castro

A Joséfinha coitadinha
Tocava a sua guitarra
Sempre metida na farra
Uma noite inteirinha
Não vejo que sou ceguinha
É por isso que estou sofrendo
Mas apesar de não estar vendo
A feira estou a sentir
E por tantos anos cá vir
Já te fico conhecendo

E o Matias que também andava
Nesta dita companhia
Da Joséfinha era o guia
Que pela mão a levava
Tudo gente que cantava
Naquelas casas de pasto
Partiram sem deixar rasto
Alunos da mesma escola
E com tanto tocar viola
Levo as unhas de pau gasto

Com o cante no sentido
Já chegou o Zambujeira
Sentou-se numa cadeira
Ficou no grupo metido
Ali ficou entretido
Foi cantando e foi bebendo
Pelo jeito que estou vendo
Vou ficando embriagado
E com três dias assentado
E as bordas do cu ardendo

Manuel Martins Mira

Sorrisos
Guida Brito

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Uma conversa

Definição de acaso: viras-te e encontras uma conversa.

Definição de conversa- conversa é a arte mais difícil de coordenar palavras com olhar. Numa conversa os olhares e as palavras não se esgotam e sabem sempre intervir. A conversa sabe sempre o que dizer e o olhar também.
"Gosto de conversar: gosto de dar dois dedos de conversa sem nada na manga. Gosto de conversar com quem não se queixa; não me conta e sabe sorrir ao vento. Gosto de conversar com quem tem tempo mesmo que o não tenha; gosto de conversar em horas incertas ao sabor do acaso. Gosto de viajar numa conversa.”
Sorrisos

Guida Brito

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Rancho Folclórico da Casa Povo da Conceição de Faro- feira de Castro Verde 2017


Dançam, desde 8 de dezembro de 1958, e dão baile, há alguns anos, na feira de Castro. Dão baile e fazem-nos bailar. Divertidos e profissionais, apresentam um reportório composto por corridinhos, bailes de roda, florestrias e marcha.
 Dos mais jovens aos mais velhos, a mestria é a vestimenta que trajam. Atrevidos, cativam o público que se junta à roda e se diverte nos tradicionais arquinhos dos bailes de rua. 

Lembram os “mastros”  (no centro da aldeia coloca-se um tronco alto, enfeitado de flores e bandeirinhas de papel,  à sua volta decorre o baile).


    Nos tempos antigos, ali se iniciavam namoricos. E se desmanchavam outros: ciúmes de ver o par nos braços de alguém que passava, a partir desse momento, a ter má fama nas ruas da aldeia. As meninas eram acompanhadas pelas mães; estas, com cara de poucos amigos, vistoriavam minuciosamente os pretendentes da sua jovem caçoila. “Aquele não é flor que se cheire” ou um olhar de reprovação, faziam as jovens, as mais pacatas, tremer de aflição e recusar os jovens que lhe piscavam o olho de forma atrevida. Por vezes, a situação complicava-se: os insonsos, por regra, não dominavam a arte da dança e a jovem regressava aos aposentos sem sorrir ao som das cantorias. Ir ao baile e não dançar, ou ver o que pensava ser seu nos braços de alguém, significava olhos inchados e almofada molhada pela manhã. Já os que escondiam o seu amor, ao povo e à família, aproveitavam para se sorrir, ao longe, de forma camuflada; usando amigos, em comum, para enviar miminhos de amor- no seio dos maiores secretismos. Aqueles pequenos segredos que, quando as amigas se zangavam, circulavam correndo as ruas da aldeia. Geralmente, ditavam o enclausuramento da jovem princesa. Eram tantas as histórias; são tantas as memórias.
Este fantástico grupo lembrou-me o que a memória não esquece e  o que, no coração, faz sentido.



Fiquei fascinada pela alegria desta jovem senhora que integra o grupo há 45 anos. Pura, veste a linguagem de um algarve antigo e faz gostar; faz gostar e muito.
Deslumbre-se com as fotografias:















































Sorrisos
Guida Brito