terça-feira, 1 de setembro de 2015

Histórias da minha vida- como reclamar o que nos é devido.

Navegantes de ideias


Amei esta época da minha vida. Fiz tantas loucuras.Lembrei-me, neste tempo de crise, de uma crise pela qual passei.





Era uma jovem e os jovens tudo podem. Depois três meses sem receber, nem sei porquê, e após muitos pedidos e reclamações restavam-me cerca de 50 escudos, se tanto, na minha rica carteirinha.


Era sexta-feira, bebi um cafezito e comprei um bilhete de autocarro: Ribeira Grande- Ponta Delgada. Entrei na Direção Geral de Educação e sentei-me, faltavam 5 minutitos para a dita fechar. 

Quando inquirida sobre a minha presença, abri a carteirita, mostrei todo o espaço que se encontrava repleto de vácuo e disse:
- Há 3 meses que trabalho sem receber, gastei o último tostão no autocarro, não tenho que jantar nem como voltar para casa. Preciso das devidas mesadas.

- Vamos fechar, volte segunda feira.
- Não tenho como ir, nem como voltar; não se incomode por minha causa. Feche a portita, eu continuarei aqui sentada, segunda-feira sou a primeira a ser recebida.
Voltei, calmamente, para o meu assento.

- Saia lá, minha senhora.
- ...
- Olhe que eu, hoje, estou com pressa: tenho um jantar de amigos.
- Não se preocupe, pode sair. Se restar do seu jantar, por favor, guarde e traga na segunda, eu vou precisar.
Enrolei-me na minha rica mantinha, descalcei os sapatitos e alapei-me.



Veio uma funcionária, mais uma e mais uma... Começaram as promessas,"vamos resolver", "Pode sair que já está"...
- Nã, eu daqui nã saio, nã quero dormir na rua, prefiro dormir aqui. Até fico quentinha, trouxe a minha mantinha. Essa resposta (que o dinheiro estava na conta) já a recebi vezes sem conta e o dinheiro: nada.

As horas iam passando, não sei como não me deram um tiro. Aquilo azedou. E a alentejana nas calmas, sem sapatitos, enrolada na sua mantinha.

Mais ou menos às 20 horas, foi chamada ao local a senhora Diretora Regional. Pobrezita, já estava a jantar em família, pensando iniciar um delicioso fim de semana. Ainda não conhecia os alentejanos.
- Minha senhora, pode ir que já tem o dinheiro na conta.
- Nã, eu daqui nã saio. Essa resposta já a recebi vezes sem conta. Só saio quando o gerente do banco me telefonar a informar que a conta está na conta. 
(...)

Lá recebi um telefonema a informar que a conta tinha a conta certita. Voltei para o meu lugar e tornei e alapar-me.
- Nã! Eu daqui não saio. O gerente tem que me provar que é, de facto, o gerente do banco.

Foi o pânico, a última gota, os gritos, a confusão... E eu sentadinha.

E as horas passavam. 

Perto da meia-noite, recebi o tão esperado telefonema. O senhor gerente teve a gentileza de confirmar a sua identidade, fornecendo-me todos os dados relativos à minha conta, aos quais só eu tinha acesso. Agradeci, calcei os sapatos e nas calmas dobrei a mantinha e saí. "Boa noite e bom jantar para todos." Se não me assassinaram, neste dia, foi por pura sorte.

Pergunto:
hoje, quem aguentaria 3 meses sem receber? É a diferença entre o antes e o presente.

Sorrisos
Guida Brito


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