domingo, 5 de julho de 2015

Tributo ao IC19

                                O Futuro Ali tão perto

                           
                                                   Tributo ao IC19
  Famosa pelas pontes, poucos conhecem o secretismo que encerro entre sorrisos. Nascida no interior das quentes e gélidas planícies alentejanas; lá, onde o mundo não acontece e a espera leva à morte. Atos impensados de quem não ultrapassou as linhas do horizonte. Ainda hoje me questiono: se estava escrito nos genes ou se uma infância rudimentar me encurralou numa vida plena de aventuras, num corrupio de atos insólitos e delirantes. Provavelmente, o prémio de quem desconhece o medo e desbravou cada um dos bocadinhos do seu caminho. Embora pacata, obediente e sem sal, encerrava (tal como hoje) os mais pirralhos pensamentos. Lembro-me com o sonhar sair de casa, viajar, fumar e ultrapassar a última linha de terra visível do canto do meu quintal. E, era na sombra da velha oliveira que me prometia um sol brilhante. Sonhava com o futuro, o presente era capa que não me servia. Cedo, o audível “Não vás por aí!” se tornou um desejo a concretizar e sinto que o meu futuro aconteceu quando por irreverência o contradisse. 
Ser gente fazia parte do que queria para mim. Sempre me considerei feia. Nem o “Continuas linda!” ou “ Lembro-me de ti, tal como és hoje, portadora de uma beleza incomparável.”, proferido por alguém que não me via há 40 anos (número silabado com dor) me convence ou me altera... bahhhh! Meio selvagem, bicho de mato, pedra nascida onde nem as cabras ousam trepar! Linda sou no meu sentir, no amor aos que me rodeiam, no afago aos que precisam. Linda: sou quando, na minha infantil loucura, decido ir mais além e sempre mais além (nasci no Além Tejo e o rio presente na minha face, sempre, coloriu de bravura os dias da minha vida). Linda sou quando entre sonhos, delinho o futuro e dou voz ao meu querer. Perceberam? Gosto de mim, aquele cá de dentro.
Nunca imaginei que o atrevimento inesperado de rumar à capital para conhecer meia dúzia (eram 7) de cacos de um delicioso Caneco – grupo de escreventes que teima em se gostar, mimar e abreija,r a cada palavra que salta do alto da imaginação e se alapa num ecrã com acesso ao coração - me ruborizasse a fronha, que apresento ao mundo, e irradiasse a minha vida de momentos hilariantes de tão profundo sentir.
Tanta escrita para chegar ao Ic19! Daqui a pouco estão fartos de mim! Mas adiante...
Conhecida pelas múltiplas viagens ao volante dos meus bólides, ninguém imagina: que a capital mais próxima se revela sempre um encalhe - para quem está habituada a não saber para onde vai mas para onde quer ir. 
Sim! Já atravessei muitas vezes a ponte... mas as tropelias sucedem-se sucessivamente. Não tenho má ideia dos condutores lisboetas: se no inicio explodem inexplicavelmente, rapidamente ficam cativos dos sorrisos, beijocas e adeus que, carinhosamente, envio ao primeiro sinal de água entornada.
Sem ajuda dos Canecos e querendo evitar a todo o custo parques de estacionamento ( eu lá saberei porquê), afirmei decidida:
- Carrinha, vamos a Lisboa e atravessamos a ponte- ela estremeceu e eu fiquei feliz.
Embora não tivesse publicado, as minhas intenções, no facebook: todos pareciam saber que a alentejana chegara. Uns paravam, outros esperavam e eu fiz tudo direitinho. Virei corretamente entre vias e vielas até me encontrar a 100 metros do destino. Uma manobra impensada, uma viragem contrária levou-me a conhecer mais uma zona da famosa capital. E agora? Não sei. Decidi apresentar-me , pessoalmente, aos habitantes de tão distinto local. Aproveitei uns semáforos, parei entre muitos, abri o vidro e obriguei (entre aspas) os que me rodeavam a copiar as minhas ações.
- Por favor! Praça de Espanha?
- Ui! Vem de lá!
- Eu sei! Mas gostei tanto que quero retornar- sorri.
- Pois! Mas agora já não consegue...
Mau! Recostei-me (com a tradicional calma) no assento, enquanto enviava gestos de carinho aos que passavam pela esquerda, pela direita e com vontade de passar por cima.
- Que fazemos?- Inquiri com alguma marotice.
- Minha senhora! Quer que eu atravesse o carro, pare o trânsito e você vira para trás?
- Quero- respondi ignorando o pânico do meu simpático meio de transporte.
E assim foi- ahahahhahahahahaahahah- Lisboa parou para me ver passar.
Adoro os lisboetas! Amo esta gente calma, simpática e desenrascada. Na próxima vez, publico no facebook:
" Amanhã, a alentejana atravessa a ponte, 10 horas."
É certo que todos irão gostar de me rever e muitos outros me escoltarão. Obrigada, gente boa.
Publiquei e as benesses não tardaram em chegar: mails com roteiros personalizados (adaptados à alentejana), telefonemas... caminhou mais longe, um simpático habitante local que decidiu acompanhar as minhas travessias sempre que remava até à capital. Provavelmente um colecionador de estampas e cromos ou alguém que, também, encerrava em si a esperança de sentir o sol brilhar. E tantos foram os “para lá” e “para cá” que as pontes se tornaram minhas. Sei-as de cor e salteado - salteado porque aquele piso de ferros quadriculado são o terror da minha doce carrinha.

E foi nestas andanças que o conheci: aquele que me abanaria as estruturas e me faria sonhar com um futuro ali tão perto.
O sol, envergonhado ou sem saber gerir o que adivinhara, chamou a lua que, habituada a arrepios incessantes e ao roçar dos amantes, semeou o caus em quem precisava de um simples raio de sol. E numa velocidade louca, entre aceleras, espera por mim e vira aqui, o telefone transpira:
- Estás no IC19.
Apaixonei-me mesmo ali! Por um mágico local onde todos pareciam aprender a voar, por piscas intermitentes que refletiam as entranhas de quem ainda não sabia amar. Vislumbrei curvas sedutoras, ternura sem fim e fiquei presa por um simples olhar. Qual ponte nem meio ponte! Amei-te ali ao primeiro roçar!
Tal foi a sedução (nunca ninguém me tinha brilhado assim) que decidi percorrer-te antes do tempo ser tempo. Procurei-te em vão. Oh! IC, por onde andas tu? Nem vislumbre do amor que me afaga e seduz. Alcabideche, Paço De Arcos, Linda-a-Velha, portagens e mais portagens... não te vejo, não te encontro, perco-me por ti. Apesar de trocar o trânsito, o sentido e as vias aos que circulam por aí, descobri que nem tudo é Lisboa e o IC nunca vem aqui. Socorro! Homem dos cromos! Preciso de ti! E na sua infinita ternura, sorrindo e de mão dada, leva a princesa a saber a sua estrada. E conto tantas as vezes em que o “Já sei” era tão longe de ti. E claro... o homem das estampas e dos cromos. Sempre o Homem das Estampas e dos Cromos. Obrigada! Já resolvi: o mapa estampado na frente da minha incrível companheira de quatro sapatos, sempre a meu lado pela estrada, levar-me-á até ti:

Homem das Estampas e dos Cromos

Não desistas de mim
Sou alentejana, procuro o IC19, anseio que o meu futuro passe por aí.

Por muito fedelha que seja: nunca imaginaria que o para lá da linha do horizonte, visto da sombra da velha oliveira do meu quintal, era o IC19!

2 comentários:

  1. Mesmo eu, uma não utente da carrinha mágica, tenho saudades dela... é que "ela" tinha mesmo este ar aventureiro e traquinas! Resta o da dona...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. E os momentos que momentos que passámos juntas? Hilariantes, doces....

      Eliminar