quarta-feira, 13 de novembro de 2019

O bebé do contentor do lixo: Natal em 2019


Guida Brito - Navegantes de Ideias

Em meados de outubro, mais cedo do que nunca, ofuscaram por entre as prateleiras dos supermercados, as luzes de que todos se queixam mas que interiorizam como o verdadeiro espírito natalício. 





A  consoada que ditará os excessos na mesa (mais do que se consegue consumir), os objetos que um dia serão lixo, os plásticos que serão oceano, o brilho dos gastos energéticos e os afins, que são tão pouco, atraem-nos o olhar e impedem a visão de realizar a sua função: ver; ver o outro, ver o essencial.

Entre os desabafos do “Que horror! É tão cedo!” sonhamos o consumismo desenfreado e caminhamos de forma robótica entre as queixas do excesso de tudo e a falta do preciso de mais. Não nos definimos enquanto seres humanos.





Há dois mil e dezanove anos, Maria engravidou. Todos a viram e, mesmo sendo o bebé filho do Espírito Santo, José assumiu a paternidade. Maria pariu num estábulo e o bebé foi colocado na manjedoura. O bafo dos animais aqueceram-no e a Luz avisou o Mundo. 

Chegaram as gentes, chegaram os pastores, chegou a aldeia, chegaram os Reis… e, segundo reza a história, a entre-ajuda, sem juízos de valor, permitiu a vida de um bebé condenado a um fim demasiado precoce.

Hoje, Sara engravidou. Durante nove meses, grávida, dormiu na rua e pariu na LUX (local afamado  e local de passagem de muitos e muitos).

 Não havia manjedoura, colocou o bebé no contentor do lixo (o local mais quente da zona). 

Sara não teve a sorte de Maria: ninguém provou que acredita no Espirito Santo; ninguém assumiu a paternidade; ninguém a viu grávida dormindo no meio da rua; a LUX (lugar de culto de milhares de adeptos), apesar do brilho, desviou o olhar do milagre da vida que ali acontecia. Não houve Reis, não houve Presidentes, não houve Ministros, mas houve milhares de animais que a ignoraram – bufando, provavelmente, de costas para o milagre de uma vida que cresceu, durante nove meses, no chão das ruas de Lisboa.

Maria é Santa; Sara é Put#.

Sem sorrisos
Guida Brito


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