sábado, 14 de setembro de 2019

BUTÃO-A visita de Portugueses no Séc.XVII



BUTÃO ou Reino do Dragão é um pequeno País na parte sul do Tibete. É um território que viveu fechado ao mundo exterior durante séculos.




Os habitantes sempre viveram felizes em comunhão com o que a Natureza lhes proporcionava.
Marco Polo visitou a região no Séc.13 e constatou isso mesmo.

Os seus líderes durante séculos parece que viviam enfastiados de nada fazerem e de serem sempre felizes.

A Religião predominante, o Budismo, subdividiu-se em 3 outras, por ínfimos detalhes de interpretar aquela Religião.

Era esse o motivo para fazerem guerras de vez em quando. Espadas, lanças, flechas, depois mais Paz. Para quebrar a rotina e o aborrecimento...

Foi neste ambiente que ali se apresentaram por volta do ano 1625 dois Jesuítas Portugueses, Estevão Cacela e João Cabral. 

Nesse tempo interessava ao Rei de Portugal, então Filipe III, a penetração em novos territórios além-mar para tomar posse deles, inventariar possíveis riquezas e ao mesmo tempo os Jesuítas em nome da Fé Cristã alargariam o Reino de Deus, com o apoio do Papa.

Os Jesuítas informaram o Líder Espiritual ou Lama que vinham dum País pequeno e distante, demorando 12 meses a sua viagem por mar.

O Lama concluíu com lógica que esse País - Portugal - seria uma Ilha, porque tiveram de viajar de barco, quando todos os viajantes se deslocavam então por terra.

Para facilitar a sua aceitação e conseguirem os objectivos pretendidos, os Jesuítas ofereceram ao Lama mosquetes, 2 canhões e pólvora, ficando à disposição para derrotar os seus inimigos com essas armas.

Fizeram a experiência com um canhão - o barulho do disparo deve ter aterrado o próprio Lama que pode observar os efeitos de destruição possivelmente contra uma floresta.

O Líder Espiritual filosoficamente comunicou aos 2 Jesuítas portugueses a sua magnânima decisão:




1) Seria desonesto da parte dele usar aquelas armas numa batalha contra os seus inimigos, porque estes ainda não as possuíam;

2) Se usasse aquelas armas, ganharia de certeza todas as batalhas, mas o seu prestígio ficaria manchado perante Buda, porque precisou de ajuda de Bárbaros para ficar vitorioso nas guerras contra os inimigos.

Os Jesuítas retiraram-se do Butão e ainda hoje é possível ver-se aquele armamento guardado naquele Reino, inútil como dantes.


José Jorge Cameira
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Turmas de Elite – o apartheid nas escolas portuguesas

Sem Sorrisos - Navegantes de Ideias


Em postura recorrente, os alunos portugueses foram catalogados “em bons” e “menos bons” e separados por turmas. A legislação é contrária à sua existência mas ao abrigo da autonomia e flexibilidade dos Agrupamentos de Escolas, foram constituídas e têm o aval do Ministério da Educação (provavelmente, esqueceu-se das leis que elaborou e aprovou).





Em meu entender: um retrocesso, sem precedentes, na garantia dos direitos das crianças e dos direitos humanos.

Portugal, mesmo pertencendo à ONU, demorou muito tempo a adotar (e muito mais a aplicar) leis inclusivas, presentes na Declaração dos  Direitos Universais das Crianças. No entanto, conseguiu acolher, no seu seio, crianças tradicionalmente excluídas, adotando uma educação integrada que respondia às necessidades educativas de todas as crianças. Foi um processo muito longo, conseguiu-se uma escola inclusiva.

Sem Sorrisos - Navegantes de Ideias


Deste modo, a escola inclusiva foi uma realidade (embora, em muitos casos, existisse carência de técnicos que o Ministério não disponibilizou): num todo colorido e diversificado, individualizaram-se e personificaram-se estratégias educativas, promoveram-se competências universais que permitiram a autonomia e o acesso à condução plena da cidadania por parte de todos.

Uma nova escola lecionava, de forma prática, as noções de cidadania, tolerância, respeito pelo outro, partilha, interajuda… Aos poucos, foi sendo claro que não há mais saber ou menos saber: há saberes diferenciados e se o meu bom é o teu mau, ajudo-te; tu farás o mesmo com o teu bom que é o meu calcanhar de Aquiles.

Sem Sorrisos - Navegantes de Ideias


Integrámos as crianças tradicionalmente excluídas; hoje, retiramos os outros. Não é um regresso ao passado?


Para mim, separar as crianças com base em “capacidades cognitivas ou capacidades de trabalho” é uma atitude racista mascarada de pureza. 

Todos aprendemos através da experiência e uns com os outros: se os alunos com mais dificuldades ficam privados da aprendizagem com os seus pares; os outros também o ficam; e, ambos, apresentarão graves lacunas a nível da aceitação, da tolerância, do respeito pelo outro, da partilha...
Relembro um dos Direitos Universais das Crianças

"Princípio X
- A criança deve ser protegida contra as práticas que possam fomentar a discriminação racial, religiosa, ou de qualquer outra índole. Deve ser educada dentro de um espírito de compreensão, tolerância, amizade entre os povos, paz e fraternidade universais e com plena consciência de que deve consagrar as suas energias e aptidões ao serviço de seus semelhantes."

Apartheid é uma palavra africana que significa "separação", ou "o estado de ser separado"; ao separar os alunos com base nas suas características mentais ou de trabalho, estamos a recriar cenários que, no passado, foram permissivos de privação de direitos, de injustiças, de dor, de milhões de mortes. 



Será que o Mundo não consegue viver sem elites?

Temo o dia de amanhã: o dia em que se acentuar a intolerância; o dia em que as universidades escolherão os “bons”; o dia  em que as empresas escolherão os “bons”, o dia em que os “bons” têm que comprar uma redoma para se proteger das incapacidades dos outros (estou a ser irónica); o dia em que os “bons” não aguentam, o dia em que os “bons” falham, temo as atitudes dos “bons” e dos “menos bons”.

Pergunto:
- se “O Programa do XXI Governo Constitucional estabelece como uma das prioridades da ação governativa a aposta numa escola inclusiva onde todos e cada um dos alunos, independentemente da sua situação pessoal e social, encontram respostas que lhes possibilitam a aquisição de um nível de educação e formação facilitadoras da sua plena inclusão social. Esta prioridade política vem concretizar o direito de cada aluno a uma educação inclusiva que responda às suas potencialidades, expectativas e necessidades no âmbito de um projeto educativo comum e plural que proporcione a todos a participação e o sentido de pertença em efetivas condições de equidade, contribuindo assim, decisivamente, para maiores níveis de coesão social.”; qual é o cabimento legal para a existência destas turmas que separam ao invés de incluir, integrar?

- se a lei é bem explicita ao referir “Afasta-se a conceção de que é necessário categorizar para intervir”; o que são estas turmas que separam crianças com base nos “bons” e “menos bons”, com base “nas capacidades intelectuais e de trabalho”?

E muito mais existe na lei, no bom-senso e nas convenções internacionais que Portugal assinou e se comprometeu a cumprir que são contrariadas com a existência de turmas que separam as crianças, com base nas suas caraterísticas físicas e psíquicas.

Pergunto, ainda:

Não são os anos letivos que separam as crianças com base nas aprendizagens apreendidas e nas que já lhes foram lecionadas; então, para que necessitamos de mais categorias?

Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994). “O princípio fundamental das escolas inclusivas consiste em todos os alunos aprenderem juntos, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentem”

Sem sorrisos
Guida Brito


sábado, 7 de setembro de 2019

O Maltês

Josè Jorge Cameira - Coisas da nossa história - Navegantes de Ideias

No passado, antes de 1970, havia pessoas que assim era chamadas: Malteses, calcorreadores, vagabundos, andarilhos, andarengos, caminheiros, zangarilhos.




Não sei se alguém consegue explicar a razão mas foi o primeiro nome, maltês, que pegou para o Povo se referir a eles. Também não haverá explicação consistente porque em Portugal há muitas famílias, até importantes, com o apelido Maltês. 

Afinal quem eram?
Sempre homem, a pé ou "a cavalo" numa muar ou burro, que se deslocavam em modo infinito de uma aldeia para outra, barbudos. Sempre circulando. Alimentavam-se do que encontravam no campo: frutas nas árvores, melões e melancias e até cenouras. Alguns transportavam consigo um tacho ou uma panela presa à roupa com um atilho. Em cada Aldeia, ao anoitecer, dormiam numa casa em ruína ou abandonada ou num telheiro. Parece que a solidão lhes era prazenteira. A sua vida no Inverno era atroz, dolorosa. Seria penitência de algum pecado ou desgosto provocado?

Pediam dinheiro às pessoas que raramente davam porque eram pobres. Quando muito uma côdea de pão e umas azeitonas curtidas. Ficavam no máximo dois ou três dias em cada povoação. Não eram criminosos, muito longe disso, nada mesmo. Quando chegavam a uma aldeia as pessoas podiam ter medo deles porque vestiam roupas velhas e sujas, até rotas. As crianças, sempre atrevidas, de longe atiravam-lhes pedras e fugiam em grande gritaria.




Espantosamente tinham uma função social importante naqueles tempos. Ouviam as estórias, casos, acidentes e mortes violentas de uma aldeia e iam espalhando essas notícias pelas aldeias que visitavam a seguir.
Hoje praticamente extinguiram-se. Se os há, modernizaram-se e mexem-se daqui para ali mais comodamente.

Há e sempre houve malteses.
Quem os não viu, quem os não vê?

Manuel da Fonseca, o imortal Escritor Alentejano falecido em 1993 dedicou-lhes um lindo Poema no seu livro Panícies de 1941:

MALTÊS
 o rosto apenas virado,
que só vi em meu redor
dez pobres ajoelhados
perante mim, seu senhor.
III
Gente chegou às janelas,
saíram homens à rua:
 – as mães chamaram os filhos,
bateram portas fechadas!

E eu, o desconhecido,
o vagabundo rasgado,
entrei o largo da vila
entre dez guardas armados;
– mais temido e mais amado
que o deus a que todos rezam.
– Que nunca mulher alguma
se rendeu mais a um homem
que a moça do rosto claro
ao cruzar os olhos pretos
com o meu olhar de rei!
IV
…E vendo que eu lhes fugia
assim de altiva maneira
à sua lei decorada,
lá,
longe do sol e da vida,
no fundo duma cadeia,
cheios de raiva me bateram.

Inanimado,
tombei por fim a um canto.

E enquanto eles redobravam
sobre o meu corpo tombado,
adormecido
eu descansava
de tão longa caminhada!…

José Jorge Cameira
Beja, Agosto 2019


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Coisas da nossa história
                                     

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Educação: a casa de banho

Com sorrisos - Guida Brito - Navegantes de Ideias

O  Ministério da Educação deu orientações às escolas públicas e privadas para que adaptem casas de banho e balneários para alunos transgénero.






Lembrei-me do Manel (estória verídica, nome fictício). O Manel vertia águas por todo o lado, não percebia muito bem a necessidade de uma casinha para fazer o que pertence à natureza e a necessidade do rótulo “é menino” ou “é menina”. Para ele eram todos crianças e brincavam juntos numa euforia do cada um ocupa a função que melhor desempenha. Dava-lhe vontade e regava no não está ninguém a ver, pelos cantos e recantos do recreio. Decidi intervir e ensinar o periquito a frequentar o sítio comummente aceite para a “rega das flores”. Ao raiar do toque para o vou brincar, o Manelito saía num cruzar de pernas que evidenciava o sei o que vais fazer; eu ,sorrateira, perseguia-o e  lembrava-o do lugar adequado para o efeito. Ele, aflito em última instância, gaguejava:


- Quuuuuallllllllllll?
- A dos rapazes.
-Ahhhhh??? – respondia-me no quase que faço nas calças. O Manuel não distinguia os símbolos e as palavras escritas ainda não eram sua pertença.
- A da direita – atirava-lhe já nos momentos iniciais da satisfação das necessidades básicas.

Volta não volta, a gritaria indicava que o moçoilo tinha entrado na da esquerda.



Num regresso ao local da ocorrência, eu era rodeada por meninas chocadas: “O Manel mijou na casa de banho das raparigas”. Eram tantas as vozes e a confusão que decidi interromper os meus ensinamentos ao rapaz – até que uma estratégia inovadora e serena me assolasse à “lembradura”.

Passados dois dias, nova gritaria, alta e perplexa, interrompeu os mapas e a papelada atrasada: “O MANEL MIJOU NA RUA”. Lá me dirigi ao local para me inteirar do facto sucedido. Era tanta a confusão que – confesso - demorei algum tempo até conseguir dialogar com a pequenada.

- Não percebo a vossa indignação. Onde querem que mi.. que o Manel satisfaça as suas necessidades básicas? - Atirei a modos do vamos ver como isto se resolve.
 - Na casa de banho – respingaram todos ao mesmo tempo.
- Na casa de banho? Então? Todos gritavam assim que o Manel a usava. Ele tem que efetuar a necessidade em algum lugar.
- Na dos rapazes. Ele ia à das raparigas.
- Pois, tendes razão. Acontece que o Vosso Amigo não reconhece símbolos, não sabe ler e só sabe qual é a mão direita quando tem uma pedra na mão. Resolvam! Eu não quero é mais gritaria e quero que o Manel mi…. sossegado.




E saí dali com o coração a tremelicar – sem saber se tinha resolvido ou complicado. Com um “olho no recreio e outro nos mapas e papelada” observei as movimentações: sorri, o diálogo entre eles decorria no caminho certo.



A partir desse dia, um grupo de rapazes e raparigas (diria toda a escola) levava o Manuel à casa de banho com o rótulo Menino. Entravam todos na mesma casa de banho e ensinavam-no a lavar as mãos - depois da mijinha efetuada no sítio certo. O Manel aprendeu e deixou de precisar dos amigos; no entanto, volta e meia ia uma menina à casa de banho dos rapazes: “Manel, já lavaste as mãos?”
Se isso não ocorresse, o Manel ia à casa de banho das raparigas informar que tinha lavado as mãos.
A partir desse dia soube-se o respeito pelo outro. Não era uma questão de local onde satisfazer o que é básico mas a aprendizagem de saber estar e saber estar com o outro. E esta é a lição, para lá de rótulos e casas de banho, que eu espero que os meus alunos aprendam: saber estar, saber ser.

Com tantas orientações políticas sobre o local da rega que cada um deve frequentar, apraz-me perguntar: afinal, para que serve uma casa de banho? Não é para satisfazer as necessidades básicas e deixar limpo (saber estar, saber ser: respeitar, colaborar e ajudar) o local? E, para satisfazer necessidades tão básicas e comuns, são necessários rótulos e rótulos e rótulos? Vamos colocar na testa dos moços e das moçoilas “sou menina”, “sou menino”, “sou menino mas nasci no corpo errado”, “sou menina mas nasci no corpo errado”, “ainda não sei o que sou”, “sou o que sou”, “pareço mas não sou”, “sou mas não devia ser”, “vou ao que não sou para que não saibam o que sou” só porque necessitam mi%$#? Não vamos colocar mais divisões e menos respeito? Rotular é respeitar? O respeito pelo outro aprende-se no convívio e não no apartheid.




Imaginem o meu querido Manel a ter que aprender tanto Sou e a ter que explicar, à mãe e ao pai, a casa de banho que frequentou na escola… shiiiii! Minha Santa Barbatana!

Imaginem, ainda, o final do dia na escola; uma fila de encarregados de educação pergunta a uma só voz: “Professora, onde mijou o meu filho?” Bem, os mais coerentes marcarão reunião; primeira pergunta: onde mijou o meu filho, na segunda-feira? Segunda pergunta: e na sexta-feira? Posso saber o local da quinta-feira?

 E os muitos recados que chegarão?



Para mim, em minha opinião e para minha felicidade, era muito mais importante que houvesse papel higiénico e sabão nas escolas. Se houvesse, estou certa que os cadernos e os livros andavam muito mais limpinhos e melhor cheirosos. Mas isto sou eu a pensar, cada um lá saberá onde pretende mijar (ou não). :)


Sem vontade mas com sorrisos
Guida Brito

quarta-feira, 28 de agosto de 2019

O Sino que a aldeia não tinha - Aguiar


Recuperemos a nossa terra! - José Jorge Cameira - Navegantes de Ideias

ESTÓRIA VERÍDICA DO ALENTEJO - AGUIAR, Distrito de ÉVORA



Nos anos 60 (1960 e tal) a aldeia AGUIAR, no início do Distrito de Évora tinha muita fama de ser comunista. É que os Trabalhadores refilavam muito com os donos dos latifúndios de centenas ou mesmo milhares de hectares de terras existentes à volta da Povoação - queriam mais salário, estranportes até à aldeia... ora isso no tempo da Outra Senhora era coisa grave. 

Por isso a Diocese não mandava para lá nenhum Padre ou não fosse ele ficar também comunista ou era por castigo desse povo ser tão herege. Mas um dia um Sacerdote mais afoito ofereceu-se ao Bispo para "cristianizar" essas gentes desencaminhadas do Divino Redil. E lá foi ele para o sertão, isto é, para o Alentejo.

Encontrou uma Igreja limpa e a brilhar. Por aqui as Gentes do Sul costumam caiar as casas uma vez por ano. Isso então não falha!
Mas faltava-lhe o SINO. A Diocese não forneceu nenhum, porque não havia Padre para chamar os fiéis e também porque era parte do castigo para aquelas Almas desavindas. Não era preciso, nem mereciam!
Este Senhor Prior lá se foi aguentando e o horário da Missa, Terço era por passa-palavra. Casamentos havia poucos ou nenhuns, porque aqui o costume era ajuntarem-se, o Povo era pobre, assim não se gastava dinheiro em bodas e festanças de um dia!


Mas mulheres gostavam de se ir confessar, ou melhor, desabafar a um senhor padre que até era jeitoso. Desabafavam as suas diabruras de fêmeas, havia confiança absoluta porque o que diziam na Confissão não podia ser divulgado e ...tem de se dizer, o Senhor Prior era para elas um belo pedaço de homem, sendo bem olhado pelos buraquinhos do confessionário! Sempre lavadinho e penteado, unhas limpas. Nada parecido com os respectivos companheiros, sempre transando a suadouro do trabalho dos campos, quando não era também os cheiros mijalosos das vacas, ovelhas, cabritos e suínos !
Desse modo o Reverendo foi sabendo os pecados da Freguesia e à força do tempo, foi conhecendo o ambiente da aldeia.


Um dia uma Comissão de Moradores foi falar com o Padre, manifestando-lhe o desejo de terem um SINO no alto do campanário, tal como todas as aldeias em redor. Desconfio eu, à distância do tempo, que a intenção não era lá muito pela fé, mas sim para os trabalhadores do campo ouvirem de longe o toque de recolher a casa, coisa que não agradava lá muito ao latifundiário ou ao seu feitor lacaio.  


-- O Senhor Bispo diz que não tem dinheiro para dar um sino. Assim sendo, a única solução é o Povo fazer uma subscrição e eu mesmo me encarrego de ir a Lisboa comprar um sino de bronze, um bem bonito, com uma cruz e nome da nossa Aldeia.


Assim foi. Passados uns meses, essa tal Comissão de Moradores foi entregar ao Senhor Padre uma boa mão cheia de notas a fim de ele comprar o tal sino.


E lá foi o Ministro de Deus até Lisboa com o bolso da batina atafulhado das notas.
Passou-se um mês, dois meses...e nada de sino nem de padre.
Já o Povo desconfiava de marosca, quando numa bela manhã de domingo, ali junto ao Largo da Aldeia pára uma camioneta e o chauffer pergunta ao primeiro aldeão:
-Aqui é que é Aguiar? Trago aqui um caixote pesado com ordens para deixar aqui na Aldeia...
Depressa se espalhou a notícia pela Aldeia e gritaram uns para os outros:



                    - CHEGOU O NOSSO SINO!

Aquilo foi uma correria de todo o Povo para verem o seu SINO. Ninguém quis ficar em casa. Todos queriam assistir ao abrir do pesado caixote!


Não havia maneira de abrir o caixote, tão bem pregado ele estava. Mas diziam: isto abana muito! Sino não pode abanar, é pesado!
Com uma alavanca conseguiram tirar as tábuas cimeiras e após removerem o papelão protector, eis que fica destapada a mercadoria:

Então não é que o caixote estava completamente cheio de CORNOS? Isso mesmo: cornos de carneiros, de bodes, de bois...às dezenas, qual deles o mais torcido!

Bem. Nunca nenhuma pessoa do Mundo foi tão injuriada e difamada como esse Padre. Era filho disto, filho daquilo, cabrão, filho de uma folha de alface, paneleiro...
Até o ameaçaram com juras que se voltasse à Aldeia seria CAPADO das partes inúteis!

O caixote cheio de cornos ali ficou especado ao sol uma porção de dias, à vista de todos. E o pior era que os carros e camionetas que passavam pela Aldeia eram obrigadas a olhar o caixote, estava rente à estrada...

Depressa o Povo converteu o acontecimento em brincadeira.
As mulheres, durante a semana, passavam pelo caixote e diziam umas às outras:
-Olha... aqueles ali parecem os do teu homem!
-Pelo menos é o mais bonito par de cornos, os do teu nem cabem no caixote !

Ainda hoje, volvidos quase 70 anos, se alguém passa pela aldeia e pergunta pelo sino a algum habitante, de certeza que é corrido à pedrada !

Recolha de José Jorge Cameira

(foto da Wikipedia)



sexta-feira, 23 de agosto de 2019

A Amazónia está a arder


Sem sorrisos -  Guida Brito - Navegantes de Ideias

A Amazónia está a arder e vai arder até colapsar no não há nada. A Amazónia está a arder assim como todos os recursos vitais à vida na Terra; hoje um, amanhã outro, e no fico sentado, na impassividade das gentes de bem, procura-se vida no espaço e destrói-se o único lugar do Universo com condições à existência de vida. 





Já não sei quem são os culpados: eles (os gananciosos de um pedaço de papel a que chamam dinheiro) ou nós (os chocados sentados, cuja ação se resume ao não quero isto, partilhado, em aparente voz grossa, no virtualismo do Facebook)?

Não seremos nós os verdadeiros culpados? A nossa inatividade é tão grande que em atos não pensantes, com ar de felicidade: nos sentamos à mesa para degustar uma boa picanha provinda do Brasil; retiramos do supermercado um parece bom azeite que tem destruído o Alentejo; comprámos roupa de algodão até ao desaparecimento do Mar Aral e à contaminação dos solos; permitimos as centrais nucleares (algumas velhas e rotas na iminência de mais um grande desastre, como aquela que existe na fronteira de Portugal com Espanha); compramos os legumes xpto plastificados que não sabem a nada, que provém de áreas protegidas, destroem recursos vitais e contaminam de forma irreversível o ambiente; permitimos que seres humanos morram da forma mais degradante no Mediterrâneo; compramos plásticos mesmo sabendo que eles já nos atulharam e mataram… 





Permitimos o fim da Terra a troco de uma promessa que não se concretizará: desenvolvimento – há muito que a palavra é usada e comummente aceite no sentido contrário ao ampliar as condições essenciais à existência de vida na Terra; no sentido contrário à proteção da vida dos nossos filhos.

A destruição que se verifica na atualidade já não tem retrocesso:  existem locais na Terra onde a vida só será possível daqui a trinta milhões de anos; e mais virão, a uma velocidade que já é impossível de parar. 

A Amazónia está a arder, o planeta Terra está a morrer e nós estamos todos a ver: chocados, indignados, sentados, partilhando no Facebook um moralismo correto mas não praticado. Somos nós que ateamos os fogos no consumismo desenfreado e na postura do não penso – permitindo um desenvolvimento aniquilador da vida na Terra e permissivo do enchimento dos bolsos de meia dúzia de corruptos que nos atiram areia aos olhos.

A Amazónia está a arder; a Terra está a morrer.
Guida Brito

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

VASCO DA GAMA - Detalhes não públicos da 1" Viagem Marítima à Índia, iniciada em 8 Julho de 1497

Coisas da nossa história - Navegantes de ideias



Esta pequena estória com pormenores sórdidos que aconteceram mesmo, tem de ser encarada no tempo em que aconteceram. A educação era outra, o comportamento dos navegadores eram na base da violência para com os seus marinheiros e com outros Povos que encontravam.



Vasco da Gama (VG) foi escolhido para essa viagem por D. João II em detrimento de Bartolomeu Dias e do elegante e conciliador Pedro Álvares Cabral. 

O Rei entendia que com os Muçulmanos de religião "inimiga" não devia haver muito diálogo para encher os porões de especiarias. Toda a violência contra as populações visitadas estava legitimada pelo Rei e até pelo Papa. VG era o capitão ideal para esses desígnios. Era homem experiente, abrutalhado e insensível.






Escolheu a tripulação da nau São Gabriel no basfond lisboeta. Vadios, ladrões, chulos e até presos das cadeias foram seleccionados.

Para as limpezas gerais das naus foram arrebanhadas das ruas de Lisboa crianças vadias e abandonadas de idades entre os 10 e os 15 anos e outras compradas a familias pobres e miseráveis.

VG navegou para Sul e depois para Ocidente para apanhar os melhores ventos ganhando velocidade e a seguir voltando para Nascente até ao então Cabo das Tormentas.

Foi na primeira parte da viagem que aconteceram grandes dramas e até tragédias humanas terríveis.

Dentro da nau, de apenas 20 metros de comprimento por 8 de largura maxima, acotovelavam-se muitos marinheiros, crianças, oficiais e um religioso, Frei Pedro da Covilhã.

No meio do Oceano e já no Hemisfério Sul o alimento começou a escassear, a maior parte apodreceu com a humidade. Imaginemos aquele ambiente vivido durante cerca de 100 dias. As tempestades e os ciclones provocaram estragos nas velas e deitara abaixo o moral e havia desespero. Grassava a fome e até as solas das botas eram disputadas para serem cozinhadas. Sentia-se no ar revolta e desejo de regressar.



Aos marinheiros que morriam de noite de doença eram-lhes arrancados bocados de carne do corpo inerte para matar a fome dos mais desesperados.

As ratazanas alimentavam-se dos mortos e elas por sua vez eram caçadas pelos marinheiros em grandes lutas.

Alguns atiravam-se ao mar, nao suportando tanto sofrimento.

Os marinheiros para se entreterem faziam jogos e os que perdiam ou pagavam ou eram esfaqueados e mortos e logo jogados borda fora. Outros para pagar dívidas de jogo vendiam as esposas e filhas deixadas lá longe na Pátria.



Muitos marinheiros agarravam nas crianças e pela força ou ameaçadas por facas eram sistematicamente seviciadas e violadas. Os seus possuidores vendiam-nas em jogos.

Perante tanta atrocidade muitas das crianças optavam por se darem a marinheiros mais fortes para se sentirem protegidas. Se alguma delas ficava mais ferida e se queixava aos oficiais das sevícias sofridas era imediatamente morta ou atirada viva para o mar.

Que fazia VG perante estas atrocidades ?

O religioso da nau bem reportava a VG o que se passava com essas crianças.

Bruto, apenas respondia, em risada com os oficiais:

--Que encostem o rabo à murada!

No restante, nada fazia. Fingia que nada sabia, nada via. Estava tudo previsto devido as suas experiências em viagens anteriores. Tinha de chegar à India e voltar com os porões cheios de especiarias, não importava o preço a pagar em vidas ou os sacrifícios.

Os horrores atenuaram-se quando a nau arribou à Baía de Santa Helena, uns 200 kms antes do temeroso Cabo das Tormentas, tendo antes VG enfrentado uma sublevação na qual esteve preso, sendo libertado por intervenção do irmão, o comandante de outra nau que estranhou ver VG dirigir-se para Norte em direcção à Pátria.

Naquela Baía foram recebidos por mulheres negras indígenas nuas que aceitaram de boa vontade os avanços sexuais repetidos dos marujos em troca de botões, espelhos e bugigangas. As prolongadas orgias só terminaram quando se aproximaram deles um grupo de homens negros com ar de más intenções.

Carregaram água potável, tinham trocado tecidos e roupas por diversos animais vivos e partiram

cheios de medo na direcção do Cabo das Tormentas, rebaptizado da Boa Esperança por D.Joao II.

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José Jorge Cameira

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