“Apresentam-se como trio”- li algures. E, por muito que
pesquise, nada mais se encontra de um grupo que, sendo mesmo três, são únicos
na beleza recuperada de um Alentejo quase esquecido. Eles não cantam: encantam.
Há muito que ansiava confirmar, ao vivo, a brisa ligeira das vozes que correm e
enaltecem o som, tocado e cantado, das gentes da minha terra. É impossível não
amar: num afeto sorridente (brincalhão e atrevido) escrevem as memórias dos
mais velhos no presente de uma juventude que as orgulha e gosta; aferindo-lhe o
anseio do saber e muito mais.
Pela mão do seu
mentor (Pedro Mestre) recuperam tudo o que distingue, ao longo dos tempos, o
Ser alentejano do Ser de qualquer outro lugar do mundo. Da viola campaniça, ao
despique, ao baldão, aos bailes de roda, às modas, aos
ditos, ao cante… à recuperação de um rico património oral de outrora; não há
nada que lhes escape e resgatam o que é isto do Ser alentejano. Ao som de uma
sonoridade única (instrumental e vocal) vão gracejando palavras tão nossas que
o público os abraça num Alentejo sentido. É com pureza que “lamentam que as formigas
de asas não tenham ido à feira de Castro” e fazem suas: as expressões dos tempos que já lá
vão. Transportam ao presente a capacidade de sorrir daqueles que, numa vida tão
dura e áspera, venceram pelo desbravar de caminhos que nos permitem o Ser de
hoje.
De um repertório imenso, a minha preferência vai para “Adeus
ò Feira de Castro”; talvez porque explica as histórias cantadas “as
unhas de pau gasto e as bordas do sim senhor ardendo”. Ai! Shiiii! Santa
Barbatana! É obrigatório ouvir e partilhar; ora oiçam:
Adeus ó feira de
Castro
Adeus
ó Feira de Castro
Que
já te fico conhecendo
Levo
as unhas de pau gasto
E
as bordas do cu ardendo
Foi
uma cantiga cantada
Pelo
coxo de Alfundão
Uma
noite num serão
Às
quatro da madrugada
Na
caixa não tinha nada
E
o tempo corria áspero
Com
muitas nuvens no astro
Sem
ter casa nem guarida
Faço
a minha despedida
Adeus
ò Feira de Castro
A
Joséfinha coitadinha
Tocava
a sua guitarra
Sempre
metida na farra
Uma
noite inteirinha
Não
vejo que sou ceguinha
É
por isso que estou sofrendo
Mas
apesar de não estar vendo
A
feira estou a sentir
E
por tantos anos cá vir
Já
te fico conhecendo
E
o Matias que também andava
Nesta
dita companhia
Da
Joséfinha era o guia
Que
pela mão a levava
Tudo
gente que cantava
Naquelas
casas de pasto
Partiram
sem deixar rasto
Alunos
da mesma escola
E
com tanto tocar viola
Levo
as unhas de pau gasto
Com
o cante no sentido
Já
chegou o Zambujeira
Sentou-se
numa cadeira
Ficou
no grupo metido
Ali
ficou entretido
Foi
cantando e foi bebendo
Pelo
jeito que estou vendo
Vou
ficando embriagado
E
com três dias assentado
E
as bordas do cu ardendo
Manuel
Martins Mira
Sorrisos
Guida Brito
Pedro Mestre grande divulgador do Cante Alentejano e principalmente da Viola Campaniça!
ResponderEliminar