quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Campaniça Trio-Pedro Mestre, David Pereira e Zé Diogo Bento- um grupo com sentido nas memórias do povo alentejano- Feira de Castro 2017


“Apresentam-se como trio”- li algures. E, por muito que pesquise, nada mais se encontra de um grupo que, sendo mesmo três, são únicos na beleza recuperada de um Alentejo quase esquecido. Eles não cantam: encantam. Há muito que ansiava confirmar, ao vivo, a brisa ligeira das vozes que correm e enaltecem o som, tocado e cantado, das gentes da minha terra. É impossível não amar: num afeto sorridente (brincalhão e atrevido) escrevem as memórias dos mais velhos no presente de uma juventude que as orgulha e gosta; aferindo-lhe o   anseio do saber e muito mais. 


Pela mão do seu mentor (Pedro Mestre) recuperam tudo o que distingue, ao longo dos tempos, o Ser alentejano do Ser de qualquer outro lugar do mundo. Da viola campaniça, ao despique, ao baldão, aos bailes de roda, às modas,  aos ditos, ao cante… à recuperação de um rico património oral de outrora; não há nada que lhes escape e resgatam o que é isto do Ser alentejano. Ao som de uma sonoridade única (instrumental e vocal) vão gracejando palavras tão nossas que o público os abraça num Alentejo sentido. É com pureza que “lamentam que as formigas de asas não tenham ido à feira de Castro”  e fazem suas: as expressões dos tempos que já lá vão. Transportam ao presente a capacidade de sorrir daqueles que, numa vida tão dura e áspera, venceram pelo desbravar de caminhos que nos permitem o Ser de hoje.


De um repertório imenso, a minha preferência vai para “Adeus ò Feira de Castro”; talvez porque explica as histórias cantadas “as unhas de pau gasto e as bordas do sim senhor ardendo”. Ai! Shiiii! Santa Barbatana! É obrigatório ouvir e partilhar; ora oiçam:

Adeus ó feira de Castro
Adeus ó Feira de Castro
Que já te fico conhecendo
Levo as unhas de pau gasto
E as bordas do cu ardendo
Foi uma cantiga cantada
Pelo coxo de Alfundão
Uma noite num serão
Às quatro da madrugada
Na caixa não tinha nada
E o tempo corria áspero
Com muitas nuvens no astro
Sem ter casa nem guarida
Faço a minha despedida
Adeus ò Feira de Castro

A Joséfinha coitadinha
Tocava a sua guitarra
Sempre metida na farra
Uma noite inteirinha
Não vejo que sou ceguinha
É por isso que estou sofrendo
Mas apesar de não estar vendo
A feira estou a sentir
E por tantos anos cá vir
Já te fico conhecendo

E o Matias que também andava
Nesta dita companhia
Da Joséfinha era o guia
Que pela mão a levava
Tudo gente que cantava
Naquelas casas de pasto
Partiram sem deixar rasto
Alunos da mesma escola
E com tanto tocar viola
Levo as unhas de pau gasto

Com o cante no sentido
Já chegou o Zambujeira
Sentou-se numa cadeira
Ficou no grupo metido
Ali ficou entretido
Foi cantando e foi bebendo
Pelo jeito que estou vendo
Vou ficando embriagado
E com três dias assentado
E as bordas do cu ardendo

Manuel Martins Mira

Sorrisos
Guida Brito

1 comentário:

  1. Pedro Mestre grande divulgador do Cante Alentejano e principalmente da Viola Campaniça!

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