domingo, 14 de julho de 2019

A minha Escola Primária (1955/1958)



É exactamente aquela foto como era o edifício da minha Escola na aldeia Vale da Senhora da Póvoa, a uns 14 kms de Penamacor. Hoje é a sede da Junta de Freguesia, mas modernizada.
O meu Professor chamava-se José Maria Ladeira era natural da Moita, aldeia a 5 kms já no concelho do Sabugal.




O interior da Escola tinha na parede á nossa frente a foto de Salazar e um crucifixo. A cadeira e a escrivaninha do Professor era no fundo da sala, no canto esquerdo. Nós, alunos, dividíamo-nos em frente ao professor em filas de carteiras, cada uma para dois alunos. Éramos só rapazes, a Escola das Raparigas era no fundo do Povo, lado oposto da nossa, que era no Cimo do Povo. Fora da Escola mas dentro do espaço com gradeamento à volta havia uma grande árvore que nós subíamos nos recreios e era vulgar darmos trambolhões com os empurrões lá em cima entre nós. Fazer as necessidades ou "baixar as calças" era fora, detrás da Escola, a uns 200 metros de distância onde foi há muitos anos o cemitério da aldeia. Limpávamos o rabo a uma pedra, sempre com cuidado não tivesse ela já sido usada antes. 


O Professor era mau, ruim e uma besta. Um selvagem.
Por tudo e por nada, à mais pequena falha, asneira ao ler ou a fazer uma conta era no mínimo duas reguadas, sempre dadas com força, parecia ter-nos ódio. Até a régua, pesada e grossa, com buracos, tinha cor amarela encardida do suor das nossas mãos. 

Com a dor chorávamos, soluçávamos com descrição senão levávamos mais. Púnhamos as mãos doridas entre as pernas, com o calor aliviava. Mas a dose de reguadas podia-se repetir durante o dia.


Se um aluno não levava pelo menos um par de reguadas, nesse dia respondia tudo certo, o professor chamava-o e dizia-lhe:
- Tu hoje não as levaste, pois não? Dá cá as mãos. - E levava só duas reguadas, uma sorte.

Levei muitas reguadas sempre por não saber a tabuada, outras por brincadeira. Lembro-me de uma vez estalar os dedos das mãos e o professor levanta se com a régua e pergunta:
- Quem é que partiu a pedra ? 

Pedra, a ardósia.Todos se riram e o professor sentindo-se gozado arreou-me e com força.

Além da palmatória, havia as varas de marmeleiro. O Professor gostava delas ainda verdes porque não partiam com as caroladas nas cabeças dos alunos. Onde ele as arranjava, essas varas? As raparigas das nossas idades - entre os 7 e os 10 anos - ao domingo iam longe da aldeia onde havia marmeleiros, escolhiam uma vara forte e comprida e metiam-na no domingo à noite por baixo da porta de entrada da nossa Escola.
O Professor quando as via, os olhos brilhavam de satisfação, fazia-as zunir e dizia, vitorioso:
- Esta é das boas, vai durar.

Ele era mau, ruim que nem cornos.
Os pais não queriam que os filhos fossem à Escola. Porque nas suas courelas sempre ajudavam a tocar o burro à volta da nora, apanhar fruta, essas coisas miúdas. Mas o Professor Ladeira exigia que fossem à Escola então lá iam.
Mas diziam normalmente ao professor sobre o filho, quando o encontravam na rua:
- Casque-lhe que ele é mandrião só quer é jogar à bola na eira, é um bardino, dê-lhe, só se perdem as que caiem no chão.

Um dia. ele, após sair à tarde da Escola, viu ali perto um homem zangado a bater no seu burro.
- O' Ti Joaquim, não faça isso, qu' inda mata o burro!
E levou resposta, esse professor malvado:
- Pior faz vossemece todos os dias a bater nos mocinhos, até mete dó.

Para terminar.
Há tempos fui fazer a minha árvore genealógica. Então não é que fui descobrir que a besta daquele Professor era meu parente? A mãe dele era prima direita do meu Avô !

José Jorge Cameira
Beja, 10 Julho 2019
Outros escritos do autor, em: Recuperemos a nossa terra!



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